Por Antonielle Freitas – O cenário da proteção de dados no Brasil está prestes a passar por uma revolução significativa com a proposta do Projeto de Lei Complementar nº 234/2023, que busca criar a Lei Geral de Empoderamento de Dados (LGED). Esta iniciativa desafia o paradigma estabelecido que considera os dados pessoais como um direito à privacidade inalienável, proibindo sua comercialização. A LGED, por outro lado, propõe uma abordagem inovadora ao tratar os dados como propriedade dos cidadãos, permitindo sua compra e venda, assemelhando-se a ativos financeiros.
Contudo, essa mudança de perspectiva traz consigo uma série de desafios e preocupações. Uma das principais preocupações é a possível concentração de poder nas mãos de poucas empresas, que poderiam dominar o mercado de dados. Isso levanta questões sobre a competição e os potenciais interesses dessas corporações, que poderiam não estar alinhados com o bem-estar da sociedade em geral.
Além disso, a LGED abre espaço para a ampliação das desigualdades sociais. Indivíduos em situações econômicas desfavoráveis podem sentir-se incentivados a vender seus dados em troca de benefícios financeiros, enquanto os mais afluentes podem optar por manter sua privacidade intacta. Isso cria o risco de uma sociedade dividida em duas camadas distintas: aqueles que negociam seus dados em busca de vantagens econômicas e aqueles que priorizam a proteção de sua privacidade.
A LGED não apenas desafia o paradigma jurídico existente, mas também tem implicações profundas na sociedade e na economia, vez que a possibilidade de uma sociedade dividida com base na comercialização de dados levanta questões éticas e morais sobre equidade e justiça social. É crucial considerar como essa legislação pode impactar a coesão social e a igualdade de oportunidades.
Ademais, a mudança proposta pela LGED pode remodelar a economia, influenciando a dinâmica do mercado e o papel das empresas. O debate em torno desse projeto deve, portanto, ir além das questões legais, abordando suas ramificações na estrutura social e econômica do País.
A Lei Geral de Empoderamento de Dados representa uma transformação significativa na abordagem brasileira à proteção de dados pessoais. No entanto, os desafios apresentados, como a concentração de poder e as possíveis disparidades sociais, exigem uma reflexão aprofundada. É imperativo que o debate em torno da LGED leve em consideração não apenas seus aspectos legais, mas também suas implicações mais amplas na sociedade e na economia. Somente através de uma análise cuidadosa e discussões informadas podemos garantir que as mudanças propostas beneficiem verdadeiramente a sociedade como um todo, promovendo a equidade e a justiça social.
*Antonielle Freitas, DPO (Data Protection Officer) do escritório Viseu Advogados; Membro da Comissão Especial de Privacidade e Proteção de Dados da OAB/SP. É certificada como DPO junto ao EXIN e em Segurança Cibernética pela Cisco Networking saneamengraduada em Direito Digital pela Escola Brasileia de Direito – EBD e em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP.
Fonte: Desafios e implicações da Lei Geral de Empoderamento de Dados (LGED) no Brasil – Capital Digital