Por DEBORA MOURA — Head de Diversidade e Inclusão do Grupo Dreamers
Que legado queremos deixar depois de toda essa conversa sobre diversidade nas empresas? Já sabemos que não basta contratar, é preciso incluir e proporcionar um ambiente seguro para pessoas de grupos que não têm voz na nossa sociedade e, além disso, promover ações afirmativas que possam gerar a mudança da cultura organizacional. Ponto.
Para além desse esforço, empresas de comunicação, especialmente agências de propaganda, têm aqui a oportunidade de dar visibilidade a esses mesmos grupos sub-representados, a partir da ferramenta que têm na mão: anúncios, filmes, posts, mensagens de comunicação. Protagonistas pretos nas peças podem fazer com que a sociedade rompa automatismos quando encontra um preto na rua, sem pensar que ele é alguma ameaça.
Protagonistas com mais de 60 anos nas peças podem fazer com que a sociedade enxergue que a realidade dos 60 hoje é de plena atividade e, muitas vezes, alto poder aquisitivo. Só que, para isso acontecer, as lideranças das empresas precisam estar comprometidas com a transformação e, ainda por cima, enfrentar o monstro de levar a diversidade para o cliente, pras marcas e produtos.
Aí é que entra o líder agente da transformação. Não tem pra ninguém, é ele que vai fazer o papel de propagador da diversidade e defensor da ideia, da campanha e do conceito alinhados com a inclusão. É ele que precisa ter letramento para defender o protagonista preto, se for necessário, com muito mais empenho do que defende a cor azul no layout dele. Saber onde buscar e contratar pessoas diversas pra povoar as equipes da empresa onde ele trabalha, romper com vieses inconscientes na hora da seleção e promover processos de aceleração de carreira dos perfis diversos que já estão nas equipes.
Ter ouvido atento e escuta ativa, ter conteúdo para construir argumentos que embasem a diversidade nas peças e não simplesmente usar a diversidade porque é a conversa da hora. Quem apresenta uma campanha tem que saber os conceitos da inclusão, o que é racismo estrutural, o processo de criação pra que aquela mensagem converse também com uma pessoa com deficiência ou com mais de 50 anos. E, para isso, o líder tem de sair da sua bolha.
Sair da bolha é olhar pro lado, perguntar, acolher, reconhecer que não sabe e dar espaço para quem sabe e vivencia outras narrativas. Perguntei numa reunião de líderes: alguém aqui já foi a um baile charme? Tá cheio de publicitário preto nos bailes, nas quebradas, nos lugares com os quais a gente que é preto se identifica e encontra outros pretos como a gente. Se você não vai lá e não pergunta, fica difícil adentrar outras bolhas.
Quantas conversas sobre diversidade você já teve com sua equipe? Sabe se quem é de grupo sub-representado está confortável, entendendo seu espaço e se sentindo num ambiente acolhedor e sem comportamentos preconceituosos? A receita é exercitar o olhar atento e a escuta ativa todos os dias. Pra ouvir, entender e abrir espaço pra outras vozes.
Agora, imagina se a maioria dos líderes da sua empresa é composta de pessoas diversas? Encurta uns dois parágrafos anteriores da jornada de transformação e ainda faz bonito no resultado de negócio. Lideranças pretas, mais velhas, trans, com deficiência podem ter mais potencial pra conversar (ou pra abrir novas conversas) com outras pessoas diversas, compreender o universo da discriminação e ouvir como ocorre pra equipe, falar de assuntos delicados sem entrar em embate porque já não precisa mais e dá pra explicar o porquê das coisas. Dá pra abrir diálogos novos com o cliente sem ser militante ou combativo, porque a diversidade vai estar ali, presente, viva na reunião ou na apresentação da ideia.
Depois de toda essa conversa da diversidade, o que verdadeiramente todos precisam querer é uma sociedade mais justa e igualitária, com oportunidades iguais e menos preconceito. E sempre tendo em mente que um preto puxa outro, uma mulher puxa outra, uma pessoa com deficiência puxa outra e por aí vai. A corrente da diversidade tende a aumentar exponencialmente se você tem uma equipe diversa e propagadora da imagem de uma empresa que respeita a diversidade e proporciona a inclusão.
Nessa jornada, são muitos os aliados que a gente vem colhendo pra luta. Invista numa liderança diversa e o resultado positivo certamente virá. Mas, se a sua empresa não tem líderes pretos, com deficiência, com mais de 50 anos, da comunidade LGBT e de outras verticais da nossa sociedade, tá na hora de olhar pro lado, fazer um censo, colocar a diversidade na pauta. E seus líderes atuais precisam urgentemente, no mínimo, virar agentes da transformação.
Fonte: www.correiobraziliense.com.br/opiniao/2022/08/5025953