Questionada, Receita Federal não esclarece quanto é necessário para suportar o sistema
Contabilistas e empresas de tecnologia da informação estão pressionando a Receita Federal e o Serpro para que revejam a decisão de cobrar para uso das APIs que darão acesso ao sistema online de arrecadação fiscal, em desenvolvimento a partir da Reforma Tributária.
A aviso foi dado ainda na primeira reunião do ano entre a Receita, o Serpro e os setores que acompanham o desenvolvimento dessa plataforma, a cargo da estatal de TI. Segundo o gerente de operações de sistemas da Receita Federal e gerente do programa de implantação da Reforma Tributária, Marcos Flores, o Fisco não tem como custear a demanda.
“Via webservice não suporta e no eCAC não dá. Tem que ser API e isso tem custo que a Receita não tem como suportar”, avisou ele às empresas. Segundo o representante do Fisco, uma emenda (1801) chegou a ser apresentada ao Senado na tramitação do PLP 68/24 para garantir recursos à implementação do programa, mas ela não foi acolhida.
Procurada, a Receita Federal não respondeu aos pedidos desta Convergência Digital sobre o montante necessário para evitar a cobrança pelo uso do sistema, quanto isso vai custar aos contribuintes para uso da plataforma ou mesmo se a cobrança será somente para pessoas jurídicas. A informação até aqui é de que o acesso será nos moldes do Integra Contador, serviço já oferecido e cobrado pelo Serpro, mas que até aqui envolve um uso pequeno de transferência de dados em comparação com o que se espera a partir da Reforma Tributária.
Enquanto isso, diferentes setores se preocupam com o impacto. “Há duas semanas fomos à sede do Serpro e estamos recebendo muitas reclamações de colegas falando sobre a questão de pagar o acesso ao Integra Contador”, revela o presidente do Conselho Regional de Contabilidade do Rio Grande do Sul, Márcio Schuch, que é do grupo de estudos do Conselho Federal dos profissionais sobre a Reforma Tributária.
Os contabilistas torcem para que transações com volume reduzido de dados não sejam cobrados. Mas a Receita e o Serpro já avisaram que não será adotada uma linha de corte clara. “Isso foi bastante questionado, mas a Receita mantém a mesma fala, de que para o uso não intensivo, uso de consumo normal, manterá de forma gratuita. Mas para aqueles que têm uso mais intensivo, uma necessidade maior de informações sendo recebidas e enviadas, o serviço será tarifado. Só que isso não está claro e não há intenção de esclarecer, sob alegação de segurança”, diz Schuch.
Para os desenvolvedores de software, especialmente aqueles que se preparam para integrar o novo programa do Fisco nos ERPs das empresas, a preocupação é maior, porque no caso desses clientes o volume de dados será necessariamente grande.
“Do ponto de vista operacional, é um ferramental inovador segundo o que já foi apresentado pelo Serpro. Mas estamos alertando, inclusive formalmente, sobre essa questão da cobrança. A Reforma Tributária é uma ação do Estado, não é uma opção do contribuinte”, aponta o diretor de relações institucionais da Brasscom, Sergio Sgobbi.
“A plataforma tem uma monetização e essa monetização está sendo justificada pela Receita por falta de orçamento. Significa que cada acesso do contribuinte vai ser cobrado para monetizar a Receita, que pagará o Serpro. Mas isso conceitualmente está errado. Hoje o sistema fiscal financeiro é gratuito. Caso persista essa questão da monetização, isso é um aumento de custos direto para as empresas. A Reforma Tributária já tem um IVA estimado em 28%, e agora terá custos adicionais quando se propunha reduzir”, completa.
As empresas de software também pedem maior previsibilidade e participação ativa no desenvolvimento da plataforma, pois serão as intermediárias com o setor produtivo. Em nota, a Associação Brasileira das Empresas de Software ressalta a importância de uma regulamentação clara, detalhada e previsível, permitindo que o setor de tecnologia e software se adapte com segurança às novas exigências fiscais.
“É fundamental que o setor privado seja ouvido no processo de regulamentação – A ABES reforça a importância da participação ativa das empresas de tecnologia e software nas discussões sobre a regulamentação da reforma, garantindo que as soluções desenvolvidas pelo setor atendam às necessidades do mercado e sejam viáveis para negócios de todos os portes”, diz a entidade.