Copom sobe Selic aos 3,5% ao ano e antevê nova alta de 0,75 ponto

BC repetiu a dose do ajuste do 0,75 feito em sua última reunião sobre política monetária. Repetiu ainda que os juros não devem subir nos próximos meses a ponto de frear a atividade econômica. No entanto, não garante mais que esse plano de voo não seja alterado. O principal risco inflacionário, de acordo com o Copom, vem de eventual descontrole das contras públicas e adiamento da agenda de reformas no Congresso

O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) subiu nesta quarta-feira (17) a meta para os juros básicos (Selic) em 0,75 ponto, aos 3,50% ao ano. E, assim, confirmou o aviso dado há seis semanas, repetindo a dose do ajuste feito em sua última reunião sobre política monetária.

A decisão foi unânime, assim como praticamente era entre os participantes do mercado. Entre 98 fontes consultadas pelo Valor na última semana, nada menos que 96 já esperavam por essa decisão. Apenas duas divergiam, mirando em alta de 1 ponto.

Para a próxima reunião, de acordo com o comunicado publicado nesta noite, uma nova alta de 0,75 ponto deve chegar, levando a taxa aos 4,25% ao ano. Foi mantida no texto a expressão “normalização parcial da taxa de juros”. Ou seja, o BC indica que o processo de alta não deve levar a Selic, no final, ao patamar do que eles chamam de “juros neutros”. A novidade, no entanto, foi acrescentar que “não há compromisso com essa posição”. Ou seja, o BC pode mudar de ideia daqui e subir sim a taxa básica acima desse nível “neutro”, a depender dos riscos pela frente.

Vale reforçar que se o estímulo dado pelo BC à economia fica menor a partir desta quinta (6), no entanto, continuará sendo dado.

Em economês, a Selic segue “estimulativa”. Esse patamar, quando ultrapassado, oferece taxas de juros que desestimulam o crescimento econômico; abaixo dele, que incentivam. Consta no último Relatório de Inflação do BC que esse degrau dos “juros neutros” – nem empurram e nem travam a economia – se situe hoje nas proximidades dos 6% ao ano. Ou seja, ainda bem acima da Selic definida nesta noite.

“O comunicado volta a reforçar, agora até com mais ênfase, a responsabilidade do Congresso como figura principal na condução da inflação, nos gastos públicos e reformas”, diz João Beck, sócio da BRA. “Mas o mercado esperava algo mais duro.” De acordo com ele, é esperado um comportamento de alta das taxas do mercado futuro de juros nesta quinta (6). “O BC continua comunicando juros mais estimulativo, mas preferindo subir juros numa velocidade menor, porém por um período mais longo.”

“A decisão foi basicamente em linha com o esperado”, diz economista-chefe da Genial Investimentos, José Márcio Camargo. Mas que sutilezas ficaram expostas, demonstrando que incertezas crescentes pela frente.

“A primeira coisa importante é que o BC parece um pouco menos otimista em relação a atividade do que na reunião passado, quando diz que a atividade ‘ainda’ permanece acima do usual. A palavra ‘ainda’ não constava no comunicado anterior, quando sugeria que a atividade poderia continuar crescendo indefinidamente.”

João Manuel Campanelli, chefe de operação do banco de câmbio Travelex Bank, destaca alguns riscos no balanço apresentado pelo BC que podem comprometer a continuidade do crescimento nacional. Entre eles, a velocidade com que a vacinação acontecerá no Brasil nos próximos meses e fatores externos, como o risco de inflação nos Estados Unidos.

“A princípio, com isso, devemos ter um viés de alta pelos próximos tempos, mas vale aguardar a ata que será divulgada na terça (10), que deve dar mais detalhes sobre se esse ajuste continuará intenso ou será mais brando daqui em diante“, diz.

  • Com juros mais altos, o retorno oferecido pela renda fixa brasileira passa a se tornar mais alinhado a toda sorte de riscos oferecidos aqui. E, dessa forma, mais dólares podem ser atraídos ao país ou menos afugentados. O que, por sua vez, pode pressionar o seu preço em reais para baixo. Tem sido esse o principal veículo para a alta do custo de vida no Brasil.

A meta do Banco Central neste ano é entregar uma variação média dos preços medida pelo IPCA de 3,75% em 12 meses, com intervalo de tolerância de entre 2,25% e 5,25%. A última medição feita IBGE, medida pelo IPCA-15, aponta inflação em 12 meses acima do teto da meta em março, em 5,52%.

LEIA A ÍNTEGRA DO COMUNICADO

Em sua 238ª reunião, o Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu, por unanimidade, elevar a taxa Selic para 3,50% a.a.

A atualização do cenário básico do Copom pode ser descrita com as seguintes observações:

No cenário externo, novos estímulos fiscais em alguns países desenvolvidos, unidos ao avanço da implementação dos programas de imunização contra a Covid-19, devem promover uma recuperação mais robusta da atividade ao longo do ano. A presença de ociosidade, assim como a comunicação dos principais bancos centrais, sugere que os estímulos monetários terão longa duração. Contudo, questionamentos dos mercados a respeito de riscos inflacionários nessas economias podem tornar o ambiente desafiador para países emergentes;

Em relação à atividade econômica brasileira, indicadores recentes mostram uma evolução mais positiva do que o esperado, apesar da intensidade da segunda onda da pandemia estar maior do que o antecipado. Prospectivamente, a incerteza sobre o ritmo de crescimento da economia ainda permanece acima da usual, mas aos poucos deve ir retornando à normalidade;

Com exceção do petróleo, os preços internacionais das commodities continuaram em elevação, com impacto sobre as projeções de preços de alimentos e bens industriais. Além disso, a transição para patamares mais elevados de bandeira tarifária deve manter a inflação pressionada no curto prazo. O Comitê mantém o diagnóstico de que os choques atuais são temporários, mas segue atento à sua evolução;

As diversas medidas de inflação subjacente apresentam-se no topo do intervalo compatível com o cumprimento da meta para a inflação;

As expectativas de inflação para 2021, 2022 e 2023 apuradas pela pesquisa Focus encontram-se em torno de 5,0%, 3,6% e 3,25%, respectivamente; e

No cenário básico, com trajetória para a taxa de juros extraída da pesquisa Focus e taxa de câmbio partindo de R$5,40/US$*, e evoluindo segundo a paridade do poder de compra (PPC), as projeções de inflação do Copom situam-se em torno de 5,1% para 2021 e 3,4% para 2022. Esse cenário supõe trajetória de juros que se eleva para 5,50% a.a. neste ano e para 6,25% a.a. em 2022. Nesse cenário, as projeções para a inflação de preços administrados são de 8,4% para 2021 e 5,0% para 2022.

O Comitê ressalta que, em seu cenário básico para a inflação, permanecem fatores de risco em ambas as direções.

Por um lado, o processo de recuperação econômica dos efeitos da pandemia pode ser mais lento do que o estimado, produzindo trajetória de inflação abaixo do esperado.

Por outro lado, novos prolongamentos das políticas fiscais de resposta à pandemia que piorem a trajetória fiscal do país, ou frustrações em relação à continuidade das reformas, podem pressionar ainda mais os prêmios de risco do país. O risco fiscal elevado segue criando uma assimetria altista no balanço de riscos, ou seja, com trajetórias para a inflação acima do projetado no horizonte relevante para a política monetária.

O Copom reitera que perseverar no processo de reformas e ajustes necessários na economia brasileira é essencial para permitir a recuperação sustentável da economia. O Comitê ressalta, ainda, que questionamentos sobre a continuidade das reformas e alterações de caráter permanente no processo de ajuste das contas públicas podem elevar a taxa de juros estrutural da economia.

Considerando o cenário básico, o balanço de riscos e o amplo conjunto de informações disponíveis, o Copom decidiu, por unanimidade, elevar a taxa básica de juros em 0,75 ponto percentual, para 3,50% a.a. O Comitê entende que essa decisão reflete seu cenário básico e um balanço de riscos de variância maior do que a usual para a inflação prospectiva e é compatível com a convergência da inflação para a meta no horizonte relevante, que inclui o ano-calendário de 2022. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental de estabilização de preços, essa decisão também implica suavização das flutuações do nível de atividade econômica e fomento do pleno emprego.

Neste momento, o cenário básico do Copom indica ser apropriada uma normalização parcial da taxa de juros, com a manutenção de algum estímulo monetário ao longo do processo de recuperação econômica. O comitê enfatiza, entretanto, que não há compromisso com essa posição e que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados para assegurar o cumprimento da meta de inflação.

Para a próxima reunião, o Comitê antevê a continuação do processo de normalização parcial do estímulo monetário com outro ajuste da mesma magnitude. O Copom ressalta que essa visão continuará dependendo da evolução da atividade econômica, do balanço de riscos e das projeções e expectativas de inflação.

Votaram por essa decisão os seguintes membros do Comitê: Roberto Oliveira Campos Neto (presidente), Bruno Serra Fernandes, Carolina de Assis Barros, Fabio Kanczuk, Fernanda Feitosa Nechio, João Manoel Pinho de Mello, Maurício Costa de Moura, Otávio Ribeiro Damaso e Paulo Sérgio Neves de Souza.

*Valor obtido pelo procedimento usual de arredondar a cotação média da taxa de câmbio R$/US$ observada nos cinco dias úteis encerrados no último dia da semana anterior à da reunião do Copom.

Fonte: Valorinveste
Por: Gustavo Ferreira

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