O transporte marítimo de carga responde por 2,9% das emissões globais, acima da aviação
É um detalhe gigantesco que muitas empresas de importação ou de exportação – que se dizem comprometidas com a sustentabilidade – adoram deixar de lado: a pegada de carbono associada ao transporte marítimo de carga. De acordo com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), os navios de carga respondem por 2,9% das emissões globais de CO2, percentual ligeiramente maior que o atribuído à aviação. E a mesma entidade estima que 90% das mercadorias rodam o mundo sobre as águas. As empresas que estão determinadas a chegar a 2050 com cadeias de valor carbono neutras, portanto, não têm como ignorar o problema.
Enquanto muitas ainda dão de ombros, o cerco contra os navios cargueiros – 99% dos quais movidos a combustíveis fósseis, segundo a Agência Internacional de Energia (IEA) – começa a se fechar. A União Europeia determinou que, a partir deste ano, qualquer navio de grande porte que atracar na região deverá pagar pelo volume de CO2 lançado na atmosfera ao longo do trajeto. A partir de 2026, o bloco também cobrará pelas emissões de metano (CH4) e de óxido nitroso (N2O).
O objetivo, obviamente, é tornar os combustíveis fósseis menos atrativos para os navios cargueiros e, de quebra, estimular a adoção de alternativas mais respiráveis. É o caso do metanol verde (CH3OH), que difere radicalmente das variedades que são classificadas como cinza e azul. A origem dessas duas, nocivas ao meio ambiente, são o gás natural e o carvão. Já o metanol verde vem de fontes de energia renovável, e sua produção não gera poluentes.
Com US$ 81,5 bilhões de faturamento no ano passado – o que representa um salto de 32% em relação a 2021 –, a Maersk foi a primeira operadora de cargueiros a adotar uma unidade movida a metanol verde. Batizada de Laura Maersk e com capacidade para 2,1 mil contêineres de 20 pés, a embarcação singrou os mares pela primeira vez em setembro deste ano.
Ungida madrinha do navio, Ursula von der Leyen, a presidente da Comissão Europeia, comandou a cerimônia de batismo – foi ela quem quebrou a garrafa de champanhe sobre a proa, como é de praxe em rituais do tipo. O nome escolhido remete às origens do conglomerado dinamarquês, fundado por Peter Maersk Moller (1836-1927). O primeiro navio a vapor que ele comprou, em 1886, também foi chamado de Laura.
A mais recente aquisição dispõe de dois motores – um é movido a combustível tradicional e outro a metanol verde. Em comparação às demais embarcações da frota da Maersk, a nova emite 100 toneladas de dióxido de carbono a menos por dia. “Representa um marco histórico para o transporte marítimo”, declarou Vincent Clerc, CEO da companhia, no lançamento da embarcação. “Este novo navio verde é o avanço de que precisávamos, mas ainda temos um longo caminho a percorrer antes de chegarmos à neutralidade de emissões.”
Determinada a atingir a neutralidade de carbono até 2040, a Maersk encomendou outros 24 navios do tipo, com entregas previstas para os próximos quatro anos. Atualmente, ela opera mais de 700 embarcações, 400 das quais de terceiros. Para 2030, o conglomerado se impôs a meta de usar combustíveis verdes para transportar no mínimo 25% de carga, o que vai demandar cerca de 6 milhões de toneladas por ano de metanol verde.
De olho nisso, a família que controla a Maersk montou uma segunda empresa, a C2X, especializada na produção de metanol verde – a meta é produzir 3 milhões de toneladas por ano até 2030. Pelas contas da nova companhia, a demanda global por metanol, principalmente pela variedade verde, deverá atingir a marca de 300 milhões de toneladas por ano em 2050, o triplo do tamanho desse mercado hoje.
Com 493 cargueiros que circulam por 594 portos mundo afora, a chinesa Cosco também está investindo nesse combustível. Em setembro, anunciou a criação de um projeto de cooperação entre as companhias chinesas que investem em metanol verde. “O acordo representa um passo significativo em direção à aplicação de novas energias e à transformação verde da indústria naval”, declarou a Cosco por meio de sua assessoria de imprensa. Pouco antes, a empresa, que faturou cerca de US$ 58 bilhões em 2022, havia anunciado a encomenda de 12 embarcações com dois motores iguais ao do Laura Maersk.
Outra alternativa aos combustíveis fósseis é a amônia verde, cuja produção se vale da eletrólise da água e não gera emissão de poluentes. A substância, segundo a IEA, poderá responder por até 45% da demanda de combustível para navegação até 2050. Uma das companhias que apostam alto nessa solução é a mineradora australiana Fortescue, que faturou US$ 17,3 bilhões no ano passado. Decidida a atingir a neutralidade de carbono em 2030, a empresa quer usar a amônia verde para abastecer seus cargueiros e imprimir mais sustentabilidade à mineração de ferro, uma de suas principais atividades.
*Tecnologias para salvar o planeta Terra foram o tema de uma série de reportagens especiais de Época NEGÓCIOS, agrupadas na edição impressa de dezembro/janeiro e que serão publicadas no site nos próximos dias.
Fonte: Novas tecnologias tentam reduzir a pegada de carbono do transporte marítimo – epocanegocios.globo.com
Movida a metanol verde – Nova frota da Maersk emite 100 toneladas de CO2 a menos do que os navios anteriores da empresa — Foto: Divulgação