O drama da aprendizagem profissional no Brasil

MARCELO GALLO – Superintendente de Administração, Finanças e Tecnologia do CIEE

Um dos grandes dramas da sociedade atual é a empregabilidade jovem. Essa situação é vista em diferentes nações, especialmente na Europa, em países como Espanha e Itália, e também na América Latina, em especial no Brasil. Onde, conforme dados do IBGE, no primeiro trimestre deste ano, o desemprego dos jovens entre 14 e 17 anos chegou a 36,4%, e aos 22,8% entre aqueles com 18 a 24 anos.

No caso do Brasil, temos várias causas que atuam em conjunto para os elevados índices de desemprego na faixa etária mais jovem, como a baixa escolaridade, falta de experiência, crescimento do PIB aquém do necessário para garantir a geração de emprego para as novas gerações, entre outras. Entretanto, há uma “vacina” que pode combater essa situação: a Aprendizagem Profissional, programa que permite a tão necessária experiência no mundo do trabalho ao mesmo tempo em que combate a triste chaga da evasão escolar no Brasil, pois enquanto for aprendiz, o jovem não pode abandonar o ensino regular.

Estabelecendo aqui um parênteses, especificamente sobre a evasão escolar, uma pesquisa da Fundação Roberto Marinho, apontou que São Paulo tem o “melhor” percentual de jovens com 19 anos que não concluíram o ensino médio, onde “apenas” 21,7%” deles não chegaram ao último ano do ensino regular. O pior cenário está na Bahia, onde 57,1% dos jovens da mesma faixa etária não finalizaram os estudos. Uma tragédia nacional que custará muito caro às futuras gerações e ao País.

Em outra pesquisa, desta vez encomendada pelo Centro de Integração Empresa-Escola – CIEE, à Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE) e conduzida pelo professor Helio Zylberstajn, é possível conferir dados importantes a respeito da Aprendizagem Profissional e a situação dos jovens no mundo do trabalho. O levantamento aponta que 47,9% dos jovens entre 14 e 24 anos trabalham no mercado informal, contra uma média da população acima de 24 anos de 40,4%. Também mostra que os jovens são os mais desalentados, e representam 5% da população nessa condição, contra 2,3% nas faixas etárias superiores. São também os mais subocupados, com taxa de 10,5%, contra 6,6% dos mais velhos.

Mas nem tudo está perdido. A mesma pesquisa revelou que entre as empresas que contratam aprendizes, 39,9% delas citaram como muito importante a redução de custos em programas de treinamento e recrutamento. Também foi mencionada a responsabilidade social por 36,2% das organizações. Os benefícios são também fiscais, pois, conforme dados do estudo elaborado pela FIPE, enquanto um funcionário CLT tem 76,9% de encargos e contribuições sobre o salário, o aprendiz representa apenas 55,7%.

Para a economia nacional, em 2017, a massa salarial recebida pelos aprendizes gerou um impacto no PIB de aproximadamente R$ 8 bilhões, pois os jovens deixam de ser meros espectadores do mercado consumidor, para serem participantes. Muitos, inclusive, auxiliando nas despesas da família. Outro destaque positivo demonstra que para aproximadamente 90% das companhias, o jovem aprendiz é importante, muito importante ou essencial para os resultados alcançados pela organização, sendo que 41% das empresas responderam que a possibilidade de efetivação ao final do contrato era alta ou muito alta.

Um ponto de atenção que consta do material da FIPE, mostra que a cota obrigatória de 5% estava em apenas 2%. Há, portanto, uma janela de oportunidade para os jovens brasileiros, pois as vagas para aprendizes podem dobrar nos próximos anos, desde que tenhamos um marco regulatório claro, sem sobressaltos produzidos por medidas provisórias intempestivas ou normas infralegais que mudam a todo momento.

Nesta toada, é necessário destacar que encontra-se em análise pela deputada federal Celina Leão, relatora da Medida Provisória 1116, mais uma medida com tais características. A MP 1116 está prevista para ser votada nos próximos dias, e propõe uma série de mudanças na CLT e na Lei da Aprendizagem, que trarão retrocesso significativo para os aprendizes, como a suspensão de prazo para que as empresas cumpram suas cotas de contratação de aprendizes; contratos de até quatro anos para aprendizagem, dificultando o acesso de outros jovens e criando um programa extremamente longo, praticamente o tempo de uma faculdade.

Instaura a precarização do trabalho através da Lei da Aprendizagem e a competição desleal com aqueles que cursam apenas o ensino médio, exatamente a população com maior dificuldade de acessar o mundo do trabalho, especialmente das periferias das grandes cidades e dos municípios do interior. Entre outras mazelas que constam no texto da medida provisória e que já foram duramente criticadas por auditores fiscais do trabalho e pela Coordenação Nacional de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente (Coordinfância), do Ministério Público do Trabalho.

Esperamos que a relatora, deputada Celina Leão, tenha amplo conhecimento das supracitadas mazelas, e reflita a respeito dos retrocessos impostos pela MP 1116 aos jovens, especialmente aos mais vulneráveis. Por fim, entendemos que os artigos relacionados à aprendizagem devem ser remetidos para estudo da Comissão Especial da Câmara, presidida pelo deputado Felipe Rigoni e com relatoria do deputado Marco Bertaiolli, que trata sobre o Estatuto do Aprendiz, através do PL 6461/19. Espaço onde a aprendizagem vem sendo amplamente debatida de forma séria, e com os mais diferentes atores da sociedade.

Fonte: www.correiobraziliense.com.br/opiniao/
Imagem: (crédito: Caio Gomez)

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