Por Jeovani Salomão* – O jargão de país continental é conhecido por nós, brasileiros, desde que nascemos. A referência é correta, dada nossa extensão territorial. Somos praticamente do mesmo tamanho da Oceania e pouco menores que a Europa. Viajar pelo país permite conhecer diferenças culturais, sociais, gastronômicas e, dado o meu olhar vocacionado, da combinação entre pessoas e tecnologia.
Por feliz coincidência, recentemente, participei de dois eventos consecutivos fora de Brasília. O primeiro foi em Maceió, terra linda, para a qual me dirigi, honrado, para o casamento de um amigo querido. Estava tudo absolutamente maravilhoso. Os noivos investiram tempo para cuidar de cada mínimo detalhe, de forma que nós, convidados, nos sentimos altamente prestigiados com tanto carinho, dedicação e diversão. A beleza do local escolhido, beira-mar, afastado da cidade, contribuiu para momentos inesquecíveis.
Como era de se esperar, para quem se esforçou para atingir a perfeição, tínhamos a nosso dispor transporte, oferecido pelos noivos, para o translado do hotel até a cerimônia e vice-versa. Ingressei na primeira van e sentei-me, como de costume, no último banco. Logo na saída, voltando aos tempos escolares, provoquei em voz alta: “agora vamos cantar até chegar na festa”. Para surpresa de todos, um dos convidados retirou um pandeiro da mochila e, sem delongas, começou: “Não posso ficar, mais nem um minuto sem você, sinto muito amor, mas não pode ser….”. E lá fomos nós, como adolescentes, para nosso destino.
Desde o início do trajeto, até o local, a cobertura 4G funcionou muito bem, assim como a sonorização do evento, que contou com shows ao vivo, após a belíssima cerimônia. A imersão na beleza da praia não afastou a tecnologia.
No dia seguinte, após tanto deleite, fui para São Paulo, onde se realizou o Campeonato Brasileiro de Bridge de 2022. Após 2 anos de torneios nacionais virtuais, para os quais fomos forçados a migrar em função da pandemia, tivemos a oportunidade de reencontrar amigos, dar abraços calorosos e sentir fisicamente o bem-querer daqueles que não víamos desde muito. Uma ocasião especial.
A viagem de Maceió para São Paulo, no entanto, foi o revés de tanta alegria. O voo GOL partiu no horário previsto, no entanto, na aproximação para o aeroporto de Congonhas, fomos informados pelo piloto sobre um impedimento na pista. Descobrimos, depois, se tratar de um acidente envolvendo uma aeronave de pequeno porte, a qual interditou nosso destino por várias horas. Como resultado do imprevisto, pousamos em Confins. Neste momento, começou uma história recheada de despreparo, incompetência, desrespeito e absoluta ausência de visão comercial da companhia aérea.
Ficamos na aeronave por mais de uma hora, sem qualquer informação. Descobrimos a verdadeira razão do bloqueio da pista de pouso de Congonhas por conta própria, embora, possivelmente a notícia já tivesse chegado antes para a tripulação. Após a espera, ainda com a expectativa de decolar novamente, opção que fora ventilada pela empresa, fomos convidados a desembarcar. Para surpresa geral, em solo, não havia equipe de terra para orientar os passageiros, motivo pelo qual peregrinamos pelo imenso aeroporto à busca de informação. Nem mesmo os tripulantes da GOL que encontramos sabiam como proceder.
Depois de ida e vindas, informações desencontradas e uma verdadeira andança, chegamos a um salão onde estavam entulhados, sem qualquer conforto, passageiros de 4 voos cancelados, mais de duzentas pessoas e uma única atendente da empresa aérea.
Por um lado, a GOL já proporciona vários serviços digitais, incluindo compra de passagens, checkin, pacote de dados e mensagens gratuitas durante os voos, por outro, em um momento de crise, não disponibilizou nenhuma informação por intermédio de qualquer dispositivo eletrônico. Preferiu nos atender com apenas um funcionário. Não conseguiu dar previsibilidade, não tratou adequadamente as prioridades por leis – sim havia crianças e idosos desamparados no meio da multidão -, não realocou, não alimentou apropriadamente e não alojou as pessoas. Fomos tratados como números inconvenientes, frutos de um episódio convenientemente declarado fora do controle da companhia.
É certo que a GOL não tem responsabilidade sobre o acidente no aeroporto de São Paulo, mas este fato não a exime de cuidar dos seus clientes. Prestar informações, acomodar, alimentar, tratar com respeito é algo que esperamos de qualquer fornecedor. Ao contrário, tomei uma verdadeira lição de como agir de forma descuidada, despreparada, desrespeitosa.
Possivelmente, por ser um domingo, aqueles que poderiam tomar decisões efetivas estavam em outras atividades e não se dispuseram a sacrificar seu final de semana por uma situação de crise. O resultado, além de passageiros descontentes, que devem optar por outras companhias doravante, será uma verdadeira enxurrada de processos judiciais que irá custar muito mais caro para a GOL do que as providências corretas no momento certo. Por óbvio, estamos todos em um grupo de WhatsApp que criei logo no começo da confusão.
Chegando a São Paulo, após desistir da GOL e comprar um bilhete da AZUL, dirigi-me ao apart hotel reservado. No local, não havia qualquer atendimento presencial. O empreendimento é gerenciado totalmente on-line. Fiz checkin pela Internet e recebi uma senha para acesso ao prédio e ao meu apartamento. No decorrer de toda a estadia, não conversei presencialmente com nenhum colaborador da empresa que me hospedou. As dúvidas que porventura surgissem, no meu caso sobre serviços de quarto, eram esclarecidas por WhatsApp. Acomodações novas, limpas, bem-cuidadas, com tudo funcionando perfeitamente, inclusive o wi-fi.
A viagem me fez refletir sobre uma decisão que tomamos logo no nascimento da minha empresa, 18 anos atrás. Naquele momento, sem que o tema estivesse tão em evidência, e com apenas uma colaboradora, decidimos adotar em nossa tábua de valores o “respeito à diversidade”, escrito tal qual neste texto. Com a expansão dos negócios – devemos ingressar em 2023 com a perspectiva de superarmos a marca de 500 colaboradores -, estou muito feliz com a decisão. Dado o acirrado período eleitoral atual, com previsão de um segundo turno disputado a cada milímetro, sinto-me na obrigação de ampliar minha reflexão, na medida em que, se considero tão importante para a empresa acolher a diversidade, imagine o quanto o tema é vital para nosso Brasil tão heterogêneo.
*Jeovani Salmão é presidente da Memora Processos Inovadores, membro do conselho na Oraex Cloud Consulting e escritor do Livro “O Futuro é analógico”.
Fonte: Os incríveis e inacreditáveis “Brasis” – Capital Digital