A captura de CO2 pela indústria não é novidade, mas ainda é pouco usada e cada vez mais urgente. Novas tecnologias podem ajudar os setores da indústria e produção de energia a reduzirem suas emissões de gases do efeito estufa.
Com as mudanças climáticas, as tecnologias de captura de dióxido de carbono (CO2) têm se tornado cada vez mais importantes para que possamos diminuir a presença desse gás na atmosfera e garantir o futuro do planeta como conhecemos.
Na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), estamos desenvolvendo uma tecnologia inovadora para captura do CO2 baseada em sais orgânicos zwitteriônicos. Esta pesquisa representa um passo significativo na busca por soluções mais sustentáveis e eficientes para mitigar as emissões de gases de efeito estufa (GEE).
Sais zwitteriônicos
A nova tecnologia consiste na utilização de uma classe inédita de sais orgânicos zwitteriônicos para a captura reversível de CO2. Esses sais apresentam propriedades únicas que oferecem vantagens significativas em comparação às tecnologias tradicionais de captura de CO2 que utilizam aminas. Aminas são compostos orgânicos nitrogenados com caráter básico que, embora sejam eficazes na captura de CO2, apresentam problemas relacionados à sua volatilidade e degradação.
Dentre as propriedades importantes dos novos sais zwitteriônicos, destacam-se a menor entalpia de absorção de CO2 (que, de forma simplificada, é a quantidade de energia térmica envolvida na reação) e elevadas estabilidades térmica e química. A menor entalpia de reação faz com que a demanda energética do processo de captura de CO2 seja menor, e a elevada estabilidade resulta em uma menor perda do composto ao longo do processo de captura.
Essas vantagens têm o potencial de diminuir os custos operacionais do processo, o que poderia ajudar a ampliar a utilização da captura de CO2, que por sua vez ajudaria a diminuir as emissões industriais de dióxido de carbono.
CO2 e mudanças climáticas
Em 2018, o Relatório Especial do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) alertou o mundo de que as emissões de gases de efeito estufa provocadas pelo homem, em especial CO2, já foram responsáveis pelo aumento de 1,0 °C na temperatura média global em relação ao período pré-industrial, intensificando a frequência de eventos climáticos extremos.
O mesmo relatório prevê que perdas irreversíveis em ecossistemas e crises humanitárias em comunidades mais vulneráveis ocorrerão caso a temperatura do média do globo aumente em mais 0,5 °C.
Os modelos do relatório do IPCC sugerem que as emissões líquidas de CO2 devem ser reduzidas em 45% até 2030, em relação aos níveis de 2010, e atingir valor próximo de zero em 2050 para que a temperatura global média não supere em 1,5 °C os níveis do período pré-industrial.
As emissões antropológicas de gases de efeito estufa têm origem em diversas atividades, como a produção de energia (38,1%), a produção industrial (25,4%), o transporte (20,7%), o consumo doméstico de energia (8,88), a exploração de combustíveis (6,57%), a agricultura (0,39%) e o processamento de resíduos (0,04%).
Embora existam diversas tecnologias para mitigação de emissões, o número de plantas industriais operando processos de captura de CO2 ainda é reduzido. Por isso, diversas pesquisas têm se concentrado no aprimoramento de tecnologias voltadas ao setor industrial e de energia, que apresentam alto potencial de aplicação.
Processos industriais de captura de CO2
Os processos de captura de CO2 são uma realidade em setores industriais como o de óleo e gás desde a década de 1960. Neste setor, a remoção de CO2 do gás natural é tradicionalmente utilizada para aumentar a pureza e valor comercial dessa fonte energética, e o CO2 capturado é reinjetado nos reservatórios naturais, o que, além de contribuir para o aumento da extração de hidrocarbonetos, também reduz o impacto ambiental da operação.
Outro exemplo de aplicação está na indústria de refrigerantes, que utiliza tecnologias de captura para obter dióxido de carbono com alto grau de pureza, essencial para a produção de bebidas gaseificadas.
No entanto, na maioria dos casos, os processos tradicionais de captura de CO2 não têm como principal objetivo a redução das emissões de gases de efeito estufa. O foco predominante é o ganho econômico associado aos produtos resultantes.
Portanto, existe uma necessidade de ampliar a aplicação dessas tecnologias para setores como o de geração de energia, que produz grandes volumes de CO2, mas não apresenta o mesmo apelo econômico para a captura.
Nesse contexto, recentemente algumas indústrias estão utilizando a captura de CO2 com o objetivo de mitigar as emissões de gases de efeito estufa (GEE). Todavia, para viabilizar a captura de CO2 em larga escala em diferentes setores é essencial implementar incentivos econômicos ou regulamentações que obriguem sua adoção.
Além disso, o aprimoramento tecnológico desempenha um papel crucial nessa batalha pela redução dos GEE na atmosfera. Soluções inovadoras, como a desenvolvida pela UFRGS, que utiliza sais orgânicos, visam reduzir os custos dos processos de captura e expandir suas possibilidades de aplicação.
Perspectivas
Atualmente, o Instituto de Química e o Departamento de Engenharia Química da UFRGS estão conduzindo dois importantes projetos de pesquisa e desenvolvimento relacionados aos sais zwitteriônicos recém descobertos. Um desses projetos, financiado pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), busca implementar essa tecnologia em processos de purificação de gás natural proveniente de poços do pré-sal.
O outro projeto, patrocinado pela Petrobras, tem como objetivo aplicar a nova tecnologia na captura de CO2 de gases exaustos, como os provenientes da queima de combustíveis fósseis. Este último prevê, inclusive, a construção de uma planta-piloto laboratorial para testar os novos compostos em condições que simulem os ambientes industriais.
Estamos confiantes de que esses projetos fornecerão dados suficientes para as próximas etapas de desenvolvimento, que incluem a construção de uma planta-piloto que permitirá testes definitivos para validação da tecnologia em cenários reais.
Paralelamente, também estamos desenvolvendo tecnologias voltadas para o uso direto do CO2 capturado. Uma das iniciativas em destaque é a produção de metanol por meio da hidrogenação de CO2, utilizando hidrogênio verde. Essa abordagem amplia ainda mais as possibilidades de aplicação industrial desta nova tecnologia, pois agrega valor ao CO2 capturado e pode viabilizar a transição para uma economia de baixo carbono, essencial em tempos de mudanças climáticas.