CONFIAMOS NA URNA ELETRÔNICA

O setor da Tecnologia da Informação brasileiro pode sair enfraquecido dessa discussão sobre a urna eletrônica, que sempre foi motivo de orgulho nas últimas décadas. Seria um recuo diante do avanço registrado a partir das eleições do ano 2000, quando o Brasil ingressou no novo milênio com impressionante modernidade no processo eleitoral.

No momento, vemos a deputada federal do DF Bia Kicis, como presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, à frente da luta para gerar o voto impresso em paralelo ao voto eletrônico. Ela é do PSL, partido de origem do presidente Jair Bolsonaro, que também defende enfaticamente essa ideia.

Bia Kicis tem esperança de aprovar na Câmara, ainda neste semestre, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 135, que determina a instalação de impressoras acopladas às urnas eletrônicas, permitindo que se implante o voto auditável em papel. Ela alega que o processo eleitoral requer maior transparência, mesmo sem fundamento concreto que leve a sociedade a crer que já houve (ou possa haver) fraude em pleitos anteriores.

Todos sabemos que o momento é tenso no Brasil, um país que segue em direção a 2022 dividido por duas tendências ideológicas antagônicas. Reconhecendo este cenário, precisamos ter cautela ao adotar reformas radicais como esta, do voto impresso, que à luz da TI representa um retrocesso.

O debate é importante para aprimorar cada vez mais os produtos. Se existe a polêmica, esta é provocada pelo desconforto, que enseja a melhoria do produto. Entretanto, melhorar não significa fazer gambiarra ou acoplar penduricalhos.

Como presidente do Sindicato das Indústrias da Informação do DF (Sinfor), sinto-me na obrigação de defender a qualidade do atendimento prestado por diversas empresas de Brasília ao Tribunal Superior Eleitoral. Nunca esses serviços receberam qualquer questionamento. Pelo contrário, houve sempre aplausos, mesmo que outras importantes nações não tenham ainda implantado o voto eletrônico.

Para que a confiabilidade, transparência, segurança de captação e apuração de votos fossem reforçadas, o TSE criou em 2009 o Teste Público de Segurança (TPS). Procura sempre identificar falhas relativas à violação da integridade ou do anonimato dos votos em uma eleição. No mesmo ano, foi realizado o primeiro TPS, quando investigadores (hackers) tentaram burlar barreiras de segurança do sistema, sem sucesso.

Diante disso, o TPS tornou-se teste obrigatório em 2015. Deve ser realizado de preferência no segundo semestre do ano anterior ao da eleição. Apesar de ser um sistema já consolidado e reconhecido, em muitas mentes ainda pairam dúvidas quanto à garantia de segurança, auditoria, transparência, confiabilidade, integridade do processo de votação e da privacidade do voto no país.

Sociedade, especialistas e formadores de opinião divergem e provocam reflexões acerca do que hoje se defende e se apresenta. De fato, reconhecemos que nenhum sistema é totalmente seguro e a busca pela eficácia é correta e legítima. Esta afirmação representa um dogma do setor de Tecnologia da Informação (TI), por reconhecermos que a segurança é diretamente proporcional ao investimento que se faz nessa área, e inversamente proporcional ao tempo que se tem disponível para a quebra de segurança.

Precisa ser dito, nessa discussão leiga e emocional, que a urna eletrônica é apenas um dispositivo do final do processo eletrônico da apuração de votos numa eleição. E mais: não é apenas a urna que está suscetível a ataques ou fraudes. Deve ser acrescentado, melhorando o nível do debate e tranquilizando os ânimos, que todo o sistema de votação eletrônica funciona de forma estanque, operando fora das redes de computadores. Vale mostrar que, para realizar ataque cibernético, seria necessário o acesso físico ao sistema. Ou seja, seria preciso haver a ação de alguém dentro do TSE.

Outro fator que minimiza os riscos é a celeridade da apuração. Em aproximadamente quatro horas após o fechamento das urnas já se tem a apuração dos votos, o que teoricamente dificulta muito o sucesso de um ataque.

Para sensibilizar quem defende o fim da votação eletrônica, podemos esclarecer que, num processo de votação manual, há várias formas de se manipular resultados. Exemplo, se os fiscais de uma seção estiverem com intenção de fraudar, eles podem fazer isso ao final da votação do dia. Basta localizar os nomes de todos os eleitores que não compareceram à seção. Depois disso, podem votar por eles nas cédulas de papel. Porém, isso não é possível fazer com as urnas eletrônicas providas de biometria. Na verdade, o processo mais vulnerável da eleição está na contabilização dos votos, que é centralizada no TSE, requerendo fiscalização nessa etapa.

Empresários experientes de Brasília que já prestaram serviços ao TSE confiam na votação eletrônica. Afirmam, em debates no Sinfor e em outros ambientes, que até mesmo na totalização dos votos não há fragilidade. O procedimento anterior à remessa dos dados dá garantias à informação, apesar do reconhecimento de que é preciso avançar para cada vez mais aumentar a segurança, por meio do desenvolvimento tecnológico.

Quando termina a votação, é obrigatória a emissão do Boletim de Urna (BU), que é fixado na seção e distribuído para os partidos. De forma que, se houver erro ou fraude na apuração, a detecção é simples. O que constatamos é que a apuração manual é lenta e suscetível a um conjunto imenso de falhas. Com o processo mecânico da impressão dos votos, podemos ter falhas diversas nessa etapa, além do risco da quebra de sigilo, com efeitos colaterais maléficos.

Não podemos esquecer que estamos lidando com mais de 100 milhões de pessoas. Por este motivo, consideramos importante que as partes interessadas conheçam tecnicamente o tema, aprofundando-se nos aspectos de segurança implantados neste produto da engenharia nacional, porque este debate, antes de tudo, carece de conhecimento.

No mundo civilizado, a autoridade é outorgada através de diplomas legais, para que estas autoridades possam opinar e dar seus vereditos, dentro das suas competências. Se a questão é de auditoria, a transparência está em permitir o acesso de especialistas dos partidos políticos para auditarem a solução que engloba hardware e software.

Os debates na Câmara Federal e no Senado devem se intensificar nas próximas semanas e cabe ao setor de Tecnologia da Informação se posicionar, reafirmando confiança nas soluções desenvolvidas por brasileiros, para o voto de todos os cidadãos do nosso país.

Ricardo de Figueiredo Caldas
Presidente do Sindicato das Indústrias da Informação do DF (Sinfor)

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